José Antônio Marengo *
01/12/2008
O Quarto Relatório Científico do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), publicado em 2007, traz evidências contundentes das alterações do clima no planeta. O documento sugere, com confiança acima de 90%, que o aquecimento global dos últimos 50 anos é causado majoritariarmente pelas atividades humanas, destacando que o problema atingirá todas as áreas – em especial os países menos desenvolvidos situados na região tropical.
No caso do Brasil, as regiões mais sensíveis compreendem a Amazônia e o Nordeste, como destaca o Relatório de Clima do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). De acordo com o estudo, a situação é mais caótica e preocupante na Amazônia. Isso porque a bacia hidrográfica do rio Amazonas – formada por mais de mil rios e abrangendo várias nações além do Brasil – contém 70% da disponibilidade mundial de água doce. No entanto, o crescente desmatamento da região vem colocando em risco essa presença exuberante e essencial. Esse cenário de devastação – provocado em muito pela expansão do agronegócio, segundo ambientalistas – é um dos responsáveis para que nosso país esteja hoje entre os cinco maiores emissores de gás carbônico no planeta.
Os impactos das mudanças do clima já podem ser sentidos nos dias atuais – e deverão se tornar ainda mais graves no futuro, especialmente nos extremos climáticos. Em 2005, por exemplo, uma forte seca – a maior dos últimos 103 anos – atingiu o leste do Amazonas. Na ocasião, alguns rios chegaram a baixar seis centímetros por dia, provocando a morte de milhares de peixes, além de impactos na produção de alimentos e de transporte para as comunidades ribeirinhas.
De acordo com pesquisas, cenários como o visto em 2005 na Amazônia poderão ocorrer com maior freqüência. Segundo especialistas do INPE e do Hadley Centre, do Reino Unido, as chances de ocorrerem períodos de intensa seca na região amazônica podem aumentar dos atuais 5% (uma forte estiagem a cada 20 anos) para 50% em 2030, chegando a até 90% em 2100.
Impactos do clima na Amazônia
Na Tabela 1 são apresentadas algumas das projeções do clima para a Amazônia no futuro, segundo os relatórios do IPCC e do INPE. Tanto nessa região como no Nordeste brasileiro alguns modelos climáticos globais do IPCC AR4 apresentam reduções drásticas na precipitação pluvial, embora outros cenários mostrem que ocorrerá um aumento. Por outro lado, a média de todos os modelos indica maior probabilidade de redução da chuva em regiões como o leste da Amazônia e o Nordeste, como conseqüência do aquecimento global.
As projeções do IPCC AR4 sugerem ainda aumentos na freqüência de extremos de chuva para boa parte do Brasil no período de 2080-2099 – principalmente no oeste da Amazônia e no Sul e Sudeste do país.
TABELA 1Possíveis cenários climáticos futuros, derivados das análises dos modelos do IPCC AR4 e do relatório de Clima do INPE para os cenários de altas (A2) e baixas (B2) emissões de gases de efeito estufa, assim como seus impactos na Amazônia.Região Projeção do clima futuro: Altas emissões (A2) Projeção do clima futuro: Baixas emissões (B2) Possíveis impactos Norte (incluindo Amazônia) 4 a 8oC mais quente, com redução de 15% a 20% do volume de chuvas, atrasos na estação chuvosa e possíveis aumentos na freqüência de extremos de chuva no oeste da região. 3 a 5oC mais quente, com redução de 5% a 15% nas chuvas; o impacto não é muito diferente daquele previsto pelo cenário A2.
- Impactos na biodiversidade, risco da floresta ser substituída por outro tipo de vegetação (tipo cerrado).
- Baixos níveis dos rios amazônicos, podendo afetar o transporte.
- Risco de incêndios florestais devido ao ar mais seco e quente.
- Impactos no transporte de umidade atmosférica para as regiões Sul e Sudeste, com conseqüências para a agricultura e a geração de energia hidroelétrica.
Ação ampla e cooperada
Embora a vulnerabilidade social seja maior no Nordeste e a biodiversidade seja mais afetada na Amazônia, o relatório do INPE destaca que outras regiões podem experimentar impactos similares.
É essencial, portanto, garantir que as alterações climáticas sejam integradas nas políticas ambientais e de desenvolvimento, de modo a colocar o enfrentamento ao problema – avaliando as vulnerabilidades regionais e a nacional, além da proposição de medidas de adaptação – em um âmbito mais amplo.
Ainda há tempo de evitar os piores impactos das alterações climáticas. Para isso, no entanto, deverão ser tomadas, de imediato, medidas rigorosas de mitigação e adaptação. Diante do cenário já apontado por pesquisadores da área, se mostra ainda mais urgente os esforços nas regiões Norte e Nordeste – com o envolvimento de órgãos especializados do governo federal e estadual, além de universidades e organizações não-governamentais.
* Pesquisador titular do Centro de Ciências do Sistema Terrestre do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), e professor na pós-graduação do INPE. É membro de vários painéis internacionais (IPCC, Vamos-Clivar e GWSP) e de grupos de trabalho no Brasil e no exterior sobre mudanças de clima. Possui experiência na área de Geociências, com ênfase em Meteorologia e climatologia, atuando especialmente nos seguintes temas: Amazônia, clima, mudança e modelagem de clima.
Fonte : Mudanças Climáticas
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